Localizada no litoral de São Paulo, a Ilha da Queimada Grande, mais conhecida como Ilha das Cobras, carrega uma reputação tão mortal quanto suas habitantes escamosas. Apesar de sua aparência paradisíaca vista do mar, o local é restrito ao público por um motivo extremamente sério: abriga uma das maiores concentrações de cobras venenosas do planeta.
O isolamento geográfico favoreceu a evolução de espécies únicas, que, sem predadores naturais e com abundância de aves migratórias, desenvolveram características assustadoras. A principal delas é a jararaca-ilhoa, uma serpente tão perigosa que, segundo relatos, pode matar em menos de uma hora se não houver tratamento adequado. Mas ela não está sozinha nessa ilha de horrores naturais.

1. Jararaca-Ilhoa (Bothrops insularis)
A verdadeira estrela — ou vilã — da Ilha das Cobras é a jararaca-ilhoa. Endêmica do local, essa serpente é conhecida por seu veneno extremamente potente, capaz de causar necrose, hemorragias internas e falência renal em tempo recorde. Sua picada pode matar um ser humano em menos de uma hora se não houver soro antiofídico disponível.
Com comportamento agressivo e ataques rápidos, a jararaca-ilhoa não possui predadores naturais e se alimenta principalmente de aves, já que os roedores não sobrevivem no terreno acidentado da ilha. Por isso, ela desenvolveu uma toxina mais letal, para impedir que as presas escapem após o bote.
2. Jararaca (Bothrops jararaca)
Embora seja mais comum no continente, a jararaca é a ancestral da jararaca-ilhoa. Sua presença histórica na Ilha das Cobras ajudou a moldar a espécie insular. Mesmo fora da ilha, a jararaca é uma das principais responsáveis por acidentes ofídicos no Brasil, sendo considerada extremamente perigosa.
Seu veneno é hemotóxico, destruindo os glóbulos vermelhos do sangue e afetando órgãos vitais. O curioso é que, apesar de tão perigosa, dessa cobra surgiu um dos maiores avanços da medicina moderna: a base do medicamento captopril, usado no tratamento da hipertensão.
3. Surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta)
Apesar de não estar presente na Ilha das Cobras, essa serpente costuma ser citada em estudos comparativos devido ao seu veneno neuro e hemotóxico, que a torna uma das maiores ameaças da fauna sul-americana. A surucucu é a maior serpente venenosa das Américas, podendo ultrapassar três metros de comprimento.
Ela serve de referência científica para entender a evolução da jararaca-ilhoa e a pressão seletiva que a levou a desenvolver um veneno tão específico. Isso evidencia o perigo biológico da Ilha das Cobras e o motivo pelo qual seu acesso é tão restrito.
4. Cascavel (Crotalus durissus)
Assim como a surucucu, a cascavel também não habita a Ilha das Cobras, mas é fundamental para compreender o grau de toxicidade das serpentes brasileiras. Seu veneno age no sistema nervoso, podendo provocar paralisia respiratória e insuficiência renal aguda.
Comparativamente, a cascavel é menos agressiva que a jararaca-ilhoa, mas seu comportamento defensivo e seu chocalho característico fazem dela uma figura emblemática nos estudos de ofiologia. O isolamento da ilha impediu que espécies como a cascavel competissem com a jararaca-ilhoa, o que reforçou sua dominância no ecossistema insular.
5. Coral-verdadeira (Micrurus spp.)
As corais-verdadeiras possuem um veneno neurotóxico letal, e são frequentemente confundidas com corais-falsas, que são inofensivas. Apesar de não estarem na Ilha das Cobras, sua menção é importante por apresentar um contraste de ação e morfologia entre as cobras terrestres e as que evoluíram no isolamento insular.
A evolução na Ilha das Cobras não favoreceu esse tipo de toxina, mas a neurotoxicidade das corais é estudada como alternativa terapêutica para doenças neurodegenerativas, o que reforça o valor científico de habitats extremos como esse.
6. Cobra-marinha (Hydrophiinae spp.)
Apesar de aquáticas, as cobras-marinhas circundam o entorno da Ilha das Cobras. Elas vivem no mar e são incrivelmente venenosas, superando muitas serpentes terrestres em toxicidade. Seu veneno pode causar parada cardíaca em poucos minutos.
Embora raramente ataquem humanos, sua presença nos arredores da ilha reforça a necessidade de proibição do turismo e das atividades recreativas no local. Um encontro acidental com uma dessas pode ser fatal, mesmo para profissionais treinados.
7. Caninana (Spilotes pullatus)
A caninana não é venenosa, mas entra nessa lista como um lembrete de que nem toda cobra assustadora é necessariamente letal. Com mais de dois metros de comprimento, movimentos rápidos e comportamento agressivo, ela é frequentemente confundida com espécies perigosas.
Na Ilha das Cobras, a presença de predadores naturais como a caninana foi anulada pelo isolamento. Isso permitiu que a jararaca-ilhoa evoluísse livremente, tornando-se o predador absoluto do ambiente. A ausência de competição é um dos fatores que torna o ecossistema da ilha tão singular — e perigoso.
Um ecossistema intocado e letal
A Ilha das Cobras é um exemplo extremo de como o isolamento geográfico pode moldar espécies de maneira drástica. O desequilíbrio natural gerado pela ausência de predadores e pela abundância de aves migratórias criou um ambiente que favoreceu o surgimento de uma das cobras mais perigosas do mundo.
Não à toa, o acesso à ilha é controlado pela Marinha do Brasil, sendo permitido apenas a pesquisadores autorizados e com acompanhamento médico. A visitação pública é terminantemente proibida, tanto por segurança quanto para preservação da fauna local.
A biodiversidade extrema da ilha é também um campo fértil para estudos científicos. O veneno das serpentes é utilizado para a produção de soros e medicamentos, o que transforma essas criaturas assustadoras em aliadas da medicina, ainda que perigosas para o ser humano.
Mais Ilha das Cobras:
- A Ilha das Cobras abriga a jararaca-ilhoa, uma das serpentes mais venenosas do planeta.
- O local é fechado ao público e só pode ser acessado com autorização especial da Marinha.
- A jararaca-ilhoa evoluiu sem predadores, desenvolvendo um veneno mais potente.
- Pesquisas com venenos da ilha geram avanços na medicina, como tratamento de pressão alta.
- A ilha é um ecossistema isolado, sem roedores, com alta presença de aves migratórias.
- Serpentes como a surucucu, coral e cascavel servem de comparação científica para o estudo da ilha.
- A biodiversidade da Ilha das Cobras é um dos maiores tesouros naturais e também um dos mais perigosos do Brasil.

Com 25 anos de experiência no jornalismo especializado, atua na produção de conteúdos de turismo, lugares, livros, natureza e mundo.